A nova aplicabilidade internacional na proteção de dados com a LGPD.

Após análise da Lei do Marco Civil Regulatório e a Lei Geral de Proteção de Dados, verifica-se que a Lei Geral de Proteção de Dados terá aplicabilidade internacional mais atual e condizente em relação a legislação vigente. Pois a pretensão de solução do problema em escala mundial, com efeitos extraterritoriais, por meio da Lei do Marco Civil é um aspecto até intrigante.

Deve-se observar que no âmbito espacial ou territorial da aplicação dos direitos, a Lei do Marco Civil da Internet tenta frear violações de privacidade por meio de coleta em seu artigo 11:

“Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros.

§ 2º O disposto no caput aplica-se mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.”

Neste sentido, verifica-se que a problemática do artigo 11 da Lei do Marco Civil seria a aplicabilidade desta quando há fornecimento de serviços aos brasileiros, o qual a justiça brasileira não teria o poder de aplica-la, pela independente e a soberania dos demais países. Sendo uma das soluções as vias legais disponíveis no judiciário ou a cooperação judicial internacional.

Contudo posteriormente, vindo corrigir a questão, a Lei Geral de Proteção de Dados adota a regra do público alvo, como dispõe o artigo 3:

 “Esta Lei aplica-se a qualquer operação de tratamento realizada por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, independentemente do meio, do país de sua sede ou do país onde estejam localizados os dados, desde que:

I – a operação de tratamento seja realizada no território nacional;

II- a atividade de tratamento tenha por objetivo a oferta ou o fornecimento de bens ou serviços ou o tratamento de dados de indivíduos localizados no território nacional;

III – os dados pessoais, objeto do tratamento tenham sido coletados no território nacional.

§ 1º Consideram-se coletados no território nacional os dados pessoais cujo titular nele se encontre no momento da coleta.”

A referida lei prevê a aplicação a cada determinado caso, ou seja, a todos os tratamentos de dados coletados em território nacional, bem como a oferta de serviços ao cidadão brasileiro. A lei inovou ainda dispondo que não se aplica apenas a brasileiros, mas a todos aqueles que estão em solo nacional. Como por exemplo, se uma empresa estrangeira está ofertando serviços para brasileiros deverá se enquadrar a referida lei.  Deve-se lembrar ainda que a lei se aplica a pessoas naturais ou jurídicas, seja de direito privado ou público, com algumas flexibilizações para o setor público.

Exceções a qual não se aplica, estão elencadas no artigo 4 da mesma lei.

Por outro lado, cabe mencionar que a Lei de Introdução ao Direito Brasileiro que rege em seu artigo 9:

“ Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

§ 1o Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.

§ 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.”

Observa-se que o artigo 9º dispõe que nas questões envolvendo obrigações, deve ser aplicada a lei do país onde foram constituídas, reputando-se constituída no lugar onde residir o proponente.

Assim a LINDB – Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, precisaria ser atualizada em relação as atuais regras de comercio eletrônico, estabelecendo uma nova perspectiva dos contratos internacionais para uma maior efetividade das relações de consumo, e consequentemente uma maior proteção dos direitos personalíssimos.

Neste interim, merece ser comentado a existência do Projeto Lei 3514/2015:

“Altera a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), para aperfeiçoar as disposições gerais do Capítulo I do Título I e dispor sobre o comércio eletrônico, e o art. 9º do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), para aperfeiçoar a disciplina dos contratos internacionais comerciais e de consumo e dispor sobre as obrigações extracontratuais.”

O Projeto Lei visa a alteração do Código de Defesa do Consumidor, relativo ao comercio eletrônico, assim como alterar o artigo 9 da LINDB, revogando o 1 e 2 parágrafos, para estabelecer regras especificas sobre os contratos internacionais de consumo e comerciais e ainda pretende legislar, quanto aos contratos internacionais de consumo, a aplicação da lei brasileira, se o contrato estiver que ser executado no Brasil ou precedida a contratação por qualquer atividade negocial por parte do fornecedor  ou seu representante ,dirigida ao consumidores brasileiros, desde que mais favorável sua aplicação ao consumidor.

Verifica-se assim, que o projeto pretende estabelecer como foro competente para resolver as demandas jurídicas, o juízo do domicílio do titular dos dados pessoais. E que, juntamente com a Lei Geral de Proteção de Dados, com a sua regra do público alvo, que em breve estará vigorando, consolidarão uma legislação mais atualizada diante dos novos desdobramentos em um ambiente que permite violações dos direitos das pessoas que ocorram em qualquer parte do mundo.


MACIEL, Rafael. Manual prático sobre a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. 1 Edição. Goiânia: RM Digital Education, 2019, p 376.

GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil. Volume 1: parte geral. 19 Edição, São Paulo: Saraiva, 2017, p 161.

GUIDI, Guilherme Berti de Campos (ed.). Perfis falsos e a responsabilidade solidária. 2018. Disponível em: http://www.omci.org.br/jurisprudencia/194/perfis-falsos-e-responsabilidade-solidaria/. Acesso em: 30 mar. 2020

LIMA, Cintia Rosa Pereira de. Comentários a lei geral de proteção de dados: Lei 13.709/18 São Paulo: Almedina, 2020, p. 199.

Sergio Ari de Souza

Graduado em Administração e Direito, Pós Graduando em Direito Digital e Proteção de Dados, especialista em LGPD, Analista em Segurança da Informação e membro da ANPPD.

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