O que é Marco Civil da Internet?

Criada e desenvolvida nos anos 60 nos Estados Unidos, onde seria usado exclusivamente para o uso militar, a internet possui como princípio de funcionamento a procura de vários caminhos para alcançar determinado ponto, ou seja, quando um dos troncos estiver obstruído, procura-se automaticamente outro caminho.

Conceitualmente pode-se defina-la segundo a Norma 004/95 como “o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores”.

Mais atualmente a lei do Marco Regulatório conceitua como “o sistema constituído do conjunto de protocolos lógicos, estruturado em escala mundial para uso público e irrestrito, com a finalidade de possibilitar a comunicação de dados entre terminais por meio de diferentes redes”.

Neste sentido Paesani ensina:

“Portanto, a atividade informática subordina-se aos mesmos limites de ordem privada ou pública previstos para os tradicionais meios de comunicação: os primeiros conduzem os direitos de personalidade, conforme o disposto no artigo 5 da Constituição Federal do Brasil, inciso X” direito à honra, à reputação, ao decoro, à imagem, à intimidade.”, entre os limites de ordem pública insurgem-se as normas penais para tutela dos bons costumes, da segurança e do segredo”.

No Brasil, a regulamentação das relações jurídicas que acontecem na internet ainda é tímida, se compararmos ao volume crescente de pessoas que acessam essa nova realidade. Mas aos poucos, vem se buscando formas de regular o assunto, ainda com a dificuldade de acompanhar a velocidade das mudanças. Neste interim as principais normas criadas pelo Legislativo Brasileiro são a Lei dos Crimes informáticos, a Lei do Marco Civil da internet e mais recente a Lei Geral de Proteção da Dados pessoais.

A lei dos Crimes Informáticos estabelece as condutas surgidas com a internet e tipifica criminalmente os delitos informáticos no Código Penal Brasileiro.

Já o Marco Civil da Internet, Lei 12.965 de 23 de abril de 2014, estabelece segundo seu artigo primeiro “os princípios, as garantias, os direitos e os deveres para o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes da atuação da União e dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação a matéria”.

Marcacin ensina:

“A princípio, uma lei que se proponha a regular as relações estabelecidas por meio da Internet haveria de definir como campo de atuação os fatos da vida que têm existência apenas nesse ambiente, ou que apresentem diferenças suficientemente marcantes nesse ambiente em relação a situações análogas que também podem ocorrer offline. A Lei de fato encontrou e regulou alguns fatos sociais que são fruto exclusivo da Internet – como é o caso das disposições que estabelecem a neutralidade da rede ou a responsabilidade dos provedores de Internet – mas resvalou também, e pretendeu regular, situações jurídicas que não são uma exclusividade do ciberespaço – como a privacidade, a proteção a dados pessoais ou a liberdade de expressão – embora essas possam encontrar na rede uma larga amplitude de casos concretos e, consequentemente, obter maior visibilidade midiática quando ligadas a fatos ocorridos online. Mas é difícil restringir tais situações apenas ao universo da Internet, no que o Marco Civil deixa uma sensação de incompletude, ou de um encaixe imperfeito, no trato dessas matérias. ’

O Marco Civil que disciplina o uso da internet, tem como fundamento o respeito a liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento e como objetivos promover a todos o acesso à rede.

Princípios estes regulados no artigo 3 da lei que estabelecem:

“I – garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;

II – proteção da privacidade;

III – proteção dos dados pessoais, na forma da lei;

IV – preservação e garantia da neutralidade de rede;

V – preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas;

VI – responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;

VII – preservação da natureza participativa da rede;

VIII – liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta Lei.”

Dentre os princípios apresentados, merecem destaque os direitos personalíssimos de proteção à privacidade e da liberdade de expressão.

 O direito a proteção à privacidade é tratado no seu artigo 7, dentre seus diversos incisos, que enumeram os direitos do usuário da internet, sendo que os dois primeiros incisos reiteram preceitos constitucionais. Já no inciso III estabelece a inviolabilidade e sigilo das comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial, que seria no caso quando as mensagens ainda estão em seu fluxo, mas ao resultado dela, que ficou de alguma forma registrado.

O inciso VII segue a orientação defendendo a necessidade de autorização do titular para o fornecimento a terceiros dos dados coletados, e acrescenta que tal consentimento seja “livre, expresso e informado”. Também exigem consentimento expresso e de forma destacada das demais cláusulas contratuais os atos de coletar, usar, armazenar e tratar dados pessoais, segundo disposto no inciso IX. O inciso VIII limita o uso dos dados pessoais para finalidades que justifiquem sua coleta; não sejam vedadas pela legislação; e que estejam especificadas nos contratos de prestação de serviços ou em termos de uso de aplicações de internet.

O artigo 7, inciso X, menciona o direito ao esquecimento quando se trata da exclusão definitiva dos dados pessoais, a pedido do usuário titular e ao termino das relações entre as partes.

O tema volta a ser tratado do artigo 10 ao 17, mas de forma mais específica em relação a Proteção aos Registros, aos Dados Pessoais e às Comunicações Privadas.

Os artigos 18 e 19 dispõem:

“Art. 18. O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”

A liberdade de expressão é tratada nos artigos 2º, 3º, I, 8º ,18 e 19, tanto em seu caput como no §2º, e está voltada a preservar a liberdade de expressão on line, como ensina Marcacini:

“a orientação seguida pelo legislador, de não responsabilizar os provedores em decorrência de atos praticados pelos seus usuários, é nitidamente voltada a preservar a liberdade de expressão, pois, como já dito, sua corresponsabilização nesses casos os tornaria diretamente interessados em agir como ferozes censores de tudo quanto fosse publicado por meio de seus serviços. Apesar de a preocupação com a proteção da liberdade de expressão permear os principais dispositivos trazidos por essa Lei, e tal garantia constar duas vezes, nos arts. 2º e 3º, entre as normas fundamentais que a orientam, não há muito mais, na lei, a ser comentado a respeito do tema.”

Diante do tema de responsabilização, o STJ pacificou o entendimento no sentido de que, o provedor de internet somente poderá ser responsabilizado pelo conteúdo ofensivo/falso publicados por terceiros quando, uma vez notificado judicialmente para excluir as publicações em debate, não cumprir a determinação imposta pelo juízo.


CORREA, Gustavo Testa. Aspectos jurídicos da internet. 3 Edição, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 07.

BRASIL. NR 004/95. USO DE MEIOS DA REDE PÚBLICA DE TELECOMUNICAÇÕES PARA ACESSO À INTERNET. Disponível em:< https://www.anatel.gov.br/hotsites/Direito_Telecomunicacoes/TextoIntegral/ANE/prt/minicom_19950531_148.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2020.

PAESANI, Liliana Minardi. Direito e internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil. 7 Edição, São Paulo: Atlas, 2014, p 08.

NOVO, Benigno Nunez. Direito Digital. 1 Edição, São Paulo: LAECC, 2019, p. 137.

MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. Aspectos Fundamentais do Marco Civil da Internet: Lei n. 12.965/2014.São Paulo: Edição do autor, 2016, p. 768.

PAESANI, Liliana Minardi. Direito e internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil. 7 Edição, São Paulo: Atlas, 2014, p. 83.

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Sergio Ari de Souza

Graduado em Administração e Direito, Pós Graduando em Direito Digital e Proteção de Dados, especialista em LGPD, Analista em Segurança da Informação e membro da ANPPD.

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